terça-feira, 5 de março de 2019

A viagem da Raquel a Moçambique - parte 3

Eu podia dizer algo diferente só porque é Natal e não quero incomodar.

Mas a verdade é que isto é maravilhoso, tudo, toda a possibilidade de vivê-lo sem qualquer lastro nem encenação.
E nem acredito conseguir dizer que viajar ainda me surpreende, que Moçambique é dos 5 sítios mais lindos onde já estive (e não fiz o resto do ranking, atirei só o palpite, se calhar é um dos 3 ou 2) e que me sinto absolutamente feliz aqui.

Eu vim cheia de raiva e cansada de pessoas, achava que só queria estar sozinha, em silêncio.

E hoje passei a tarde na praia do Tofo com todos os domingueiros em redor, todos os pretos de todas as cores, que os pretos têm cores variadas, e saltei nas ondas com a minha mãe pela mão e o meu pai a perder os calções a cada mergulho e, porra, que bem que estavam ali os pretos a serem alegres pela humanidade macambuzia toda, e que bem que me soube poder partilhar disso.

Photo by Raquel Ribeiro

Eu que estava insensível às bugigangas étnicas, que só associava ao hedonismo de as levar para casa e poder bufar, de pequena-burguesia, que já não tenho espaço, que a bagagem na TAP é cara e outras cretinices de quem goza com os pobres, achando genuinamente ser só uma remediadazinha, sangro em silêncio por cada par de olhos que me mostrou a sua arte (tão mais bonita e valiosa do que 2/3 das inutilidades com as quais gastei o dinheiro que agora digo que não tenho, lá na enfadada Europa) e a quem digo mentiras como "não quero" ou "não posso".

 Photo by Raquel Ribeiro


Quem faz arte assim merecia mais do que ser despachado pelo turista, que ainda traz as suas futilidades agarradas à maldita brancura da pele e ao daltonismo da sua triste escala de valores.

Moçambique não está "todo destruído", não, "eles" não deram "cabo disto tudo", nem têm "ódio ao tuga", aliás, eles nem sabem de que país vimos quando falamos português com eles. Não há violência, nem sequer se tranca as portas das casas e dos hotéis. A limpeza das ruas, das aldeias e das roupas das pessoas faz da Lisboa contemporânea, por comparação, um esterco. E a liberdade de opinião é reprimida pelos mandantes do seu próprio sangue, mas eles têm a coragem de falar sobre tudo connosco.

Photo by Raquel Ribeiro

Ter tido uma guerra com este país foi de um profundo mau gosto e tê-lo abandonado aos chupistas que os governam, a pretexto de uma falsa liberdade, ainda é um crime.

Serei melhor depois de vir aqui.

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